14. Novas todas as coisas


“Eis que faço nova todas as coisas” (Ap 21,5)
Valeu a pena?
Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
(Fernando Pessoa)
A rotina é coisa benfazeja, mas tornada enfadonha pode sufocar os ânimos, matar os desejos. Nada como uma novidade para temperar os dias, dar brilho aos olhos, movimentar os ânimos internos, trazendo à exterioridade o brilho de cada fragmento de esperança escondido nos abismos do coração. O novo alumia a alma cansada; reacende os desejos enfraquecidos... Não é à toa que o evangelho é boa-nova. A presença de Jesus no mundo não é só boa notícia, mas boa e nova notícia: notícia inesperada que surpreende até os mais esperançosos e crentes. Deus superou nossa expectativa nos dando seu Filho Jesus, boa-nova universal. E esse mistério de amor é evangelho!
Ano novo, ânimos novos, propósitos novos; novos projetos, novos planos... Para isso, olhamos para trás e reavaliamos o que se passou. “Valeu a pena?”, nos perguntamos. “Aquele amor que vivemos, mas não frutificou, valeu a pena? Aquele esforço empreendido em projetos que não vingaram, valeu a pena? Aquele tempo gasto – horas e horas – com quem não soube nos valorizar, valeu a pena? Valeu a pena o tanto que corremos, o pouco que dormimos, o tanto que nos cansamos ou o marasmo ao qual nos entregamos? Valeu a pena?” Como disse o Poeta Português: “Tudo vale a pena, se a alma não é pequena”. Se olhando para trás se tem a largueza de alma para perceber o que foi bom e o que não foi, para discernir o que construiu as relações e o que as derrubou, para distinguir o que foi amor e o que foi ilusão... A alma não é pequena quando é capaz de refazer os propósitos mais nobres e se desvencilhar do que é vil e fútil.
“Eis que faço novas todas as coisas”, disse Jesus no Apocalipse (21,5). Ele, que é a boa-nova de Deus, renova a vida com sua presença amorosa. E toda alma que se entrega a ele não é pequena. Todo aquele que se une a ele em esperança de novos dias tem a largueza de alma para recomeçar. Tudo que vivemos terá valido a pena, se não tivermos alma mesquinha. O que nos feriu pode ser remédio ou vacina contra novas feridas. O que perdemos pode ser chance de novas conquistas... Tudo terá valido a pena, se confiarmos em Deus e nos entregarmos a ele.
Neste começo de ano, deixemos para trás o que não nos edificou no amor. Afinal, “as primeiras coisas já aconteceram, coisas novas é o que agora anuncio.” (Is42,9). Nosso Deus tem coisas novas e boas reservadas para nós; ele faz novas todas as coisas, a começar por nós mesmos: renova nossa esperança, restaura nossa capacidade de amar... Recomeçar: eis o desafio. Esquecer o passado: eis a tarefa!