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293. Lavar os pés uns dos outros

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01.07.2024 | 4 minutos de leitura
Yuri Lamounier Mombrini Lira
Crônicas
293. Lavar os pés uns dos outros
“Dei-vos o exemplo, para que façais a mesma coisa que eu fiz” 
(Jo 13,15)

Na cintura uma toalha 
e nas mãos uma bacia,
Solução que nunca falha 
Vem da Santa Eucaristia
(Pe. Zezinho, SCJ)

Com a celebração da Ceia do Senhor, iniciamos o Tríduo Pascal, a grande festa da Igreja na qual fazemos memória do mistério maior de nossa fé. O mistério da Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus é tão grande que não cabe num só dia. Desse modo, a celebração de Quinta-feira Santa, a Ação litúrgica da sexta-feira da Paixão e a Vigília Pascal são uma única celebração, que realizamos em três dias.  Nestes dias, a Igreja não lembra apenas dos fatos acontecidos há mais de dois mil anos. Ela os recorda e atualiza. E, como nosso povo costuma dizer, “recordar é viver”. Recordar é atualizar. Assim, revivendo os passos do Mistério Pascal de Jesus, nós nos tornamos contemporâneos de todos aqueles acontecimentos. 
Na noite da Quinta-feira Santa, em nossas comunidades, seremos convivas da Ceia que Jesus realizou com seus discípulos. Na véspera da Paixão, Jesus se reuniu com os seus discípulos e celebrou a amizade com eles. Segundo o Evangelho de João, a ceia de Jesus foi um encontro diferente, pois ali o Mestre de Nazaré não celebrou o ritual dos judeus, como um rito litúrgico a cumprir. Para surpresa de seus discípulos, Jesus tirou o manto, botou um avental e lavou os pés dos convivas, entregando aos seus discípulos um novo legado através da Eucaristia e do mandamento do amor.  
Através da Eucaristia, atualizamos o mistério pascal de Jesus em nosso cotidiano e as celebrações eucarísticas marcam o ritmo de nossa comunidade. É ao redor do altar do Senhor que encontramos o sustento para nossa caminhada. É uma oportunidade especial de encontro com Cristo e os irmãos. 
O mandamento do amor expresso por Jesus com o gesto do lava-pés é uma atitude revolucionária que nos faz repensar nossas escolhas. Ao lavar os pés dos discípulos, Jesus fez uma tarefa que era reservada aos escravos, e essa atitude causou desconforto e incômodo entre os discípulos. Pedro, inclusive, a princípio recusou ter os pés lavados por Jesus: “Tu nunca me lavarás os pés” (Jo 13,8). No entanto, Jesus lhe mostrou que quem estiver disposto a segui-lo precisa aprender que, na comunidade dos seguidores do evangelho, não existe ninguém que seja maior ou melhor; todos são irmãos em Cristo. O gesto do Mestre de Nazaré é mistagógico e pedagógico; ele mesmo se fez menor e servidor para mostrar aos discípulos como eles devem fazer. “Também vós deveis lavar os pés uns dos outros. Dei-vos o exemplo, para que façais a mesma coisa que eu fiz” (Jo 13,14-15). 
O mandamento do amor mostra que o verdadeiro poder é o serviço! O papa Francisco tem nos falado com insistência: “Prefiro uma Igreja acidentada, ferida e enlameada por ter saído pelas estradas, a uma Igreja enferma pelo fechamento e a comodidade de se agarrar às próprias seguranças. Não quero uma Igreja preocupada com ser o centro, e que acaba presa num emaranhado de obsessões e procedimentos” (EG, 49). O lava-pés realizado por Jesus na última ceia é o gesto que melhor representa essa “Igreja em saída” de que fala o Papa Francisco. 
Participar da celebração do lava-pés é sempre emocionante. Reviver essa cena do Evangelho de João sempre nos comove. No entanto, é triste perceber que é tão difícil concretizar esse gesto em nosso cotidiano. Existem tantas desavenças entre nós. Diariamente, inúmeras são as cenas de ódio que acompanhamos pelos noticiários, em nossa rua ou até mesmo em nossas casas. Infelizmente, também dentro da Igreja, ainda existem rixas e divisões. Esquecemo-nos de que em Cristo “somos todos irmãos” (Mt 23,8). Nosso desafio é fazer com que o lava-pés não seja visto não apenas como um gesto teatral revivido a cada ano na semana santa, mas que seja concretizado em nosso cotidiano. 
Em nossas comunidades, podemos dar um testemunho cheio de coragem, principalmente se, com Cristo, redescobrirmos a mística do “lava-pés”. Como Jesus, lavemos os pés uns dos outros. Na maioria das vezes, não precisaremos nem de bacia nem de toalha; bastará apenas uma palavra ou um gesto amigo. Não nos esqueçamos de que, na condição de discípulos de Jesus, nossa preocupação não deveria ser com títulos ou aplausos, mas sim em nos dispormos a “em tudo: amar e servir” e, assim, a Páscoa de Jesus acontecerá em nós.