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163. Pequena retrospectiva – sincrônica – ou prospectiva (parte 2)

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04.01.2024 | 2 minutos de leitura
Pe. Eduardo César Rodrigues Calil
Diversos
163. Pequena retrospectiva – sincrônica – ou prospectiva (parte 2)
Não há recomeço. As fatias do tempo são uma ilusão. Há começo, sempre o começo. Começo e repetição. Repetir, repetir até ficar diferente. E repetir de outro lugar. Começar, porque se há caminho, o fim não está; e quando o fim está, já não estamos mais. Não há sentido, pois, mas é possível que haja muitos fins, trágicos ou não, abrindo ou fechando começos.

Celebrei o adeus, o esvaecimento, sofri as quedas. Minha ideia não é me largar, não mais. Mas assumir-me vai longe das assunções que negam a falta. Desci do cavalo e me aproximei do ferido, maltrapilho na esquina: minha falta-a-ser.

Escrevo, portanto, a vitória, a partir do desaparecimento: o pôr do sol. A vitória não é necessária, nem a moral da história. O que escrevo não consola. A vitória que pretendo, e que atravesso como quem cruza o Rubicão é um lançar de dados, uma aposta, uma transposição. Distinguir, ao pôr o pé no rio, que há o real da perda e o perdido na perda. E com Mallarmé repetir, e começar: nada se acrescenta ao natural (a não ser o artificial: do formal, da lógica, do poema), mas há a vitória. Do indizível ao real, da impotência à vitória: “lá, onde quer que seja, negar o indizível que mente”.

Entra ano e sai ano, e com eles a ilusão de que há tempo, mas há só o vestígio do desaparecimento. A repetição do desaparecimento, seu rastro. O desaparecimento do objeto - que não há - deixa um rastro. Sem ele só haveria desaparecimento do próprio desaparecimento. Esse rastro é uma borda, é nela que estamos dançando, à beira… sempre à beira. Há pois a vitória sobre a impotência: ela é o impossível.

A transposição é a criação de uma obra de arte, um começo. O poema pode fracassar, sim. No fim, há a perda e o desaparecimento, claro. Mas na (trans)criação está o que dura, mesmo sem consistência alguma. O que ultrapassa o poder ilusório do tempo, esse artifício. O que dura é um artifício artístico, um começo, uma escrita. Muitos começos são preciosíssimos, diria Llansol. Não é uma necessidade. Mas com ela, a propósito da escrita, diria: “basta esperar que a decisão da intimidade se pronuncie. Vou chamar-lhe fio_____ linha, confiança, crédito, tecido”.


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