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137. Os desafios da pastoral urbana contemporânea

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06.02.2023 | 6 minutos de leitura
Maria da Glória e Silva Batiston
Diversos
137. Os desafios da pastoral urbana contemporânea
No mundo pós-moderno, majoritariamente urbano, não é tarefa fácil assumir a evangelização. Antes, nossa pertença a uma religião era automática, pois já nascíamos num ambiente cristão. Havia a transmissão da fé e tudo era Deus que justificava. Hoje, na pós-modernidade, vivemos numa sociedade em crise, em constante mudança, caracterizada pela globalização e pelo sistema neoliberal capitalista. Essa sociedade plural traz implicações pastorais, éticas e eclesiológicas que pedem uma evangelização apropriada às suas demandas e que responda aos seus anseios.
Os grandes centros urbanos são lugar da diversidade, da novidade, do rompimento da tradição, da tolerância e intolerância, da contradição, do contraste, de uns privilegiados e outros negados em sua humanidade. 
Nesse complexo e plural mundo, a pastoral deve identificar os desafios urbanos a serem assumidos pela evangelização, para a transmissão da fé cristã, considerando todos os riscos e possibilidades que as cidades oferecem. É preciso encontrar outros caminhos da transmissão da fé, pois a fé cristã já não é o centro da sociedade e as respostas prontas da Igreja já não respondem ao sujeito pós-moderno. “Seria tolice aventurar-se na tarefa de transmitir a fé aos contemporâneos sem considerar o seu modo próprio de vida, sua cultura, seus valores, suas angústias e desejos”.
Os grandes desafios enfrentados pela pastoral hoje são: o da interioridade, o querigmático, o comunitário, o pedagógico e o social ou da solidariedade.
No desafio da interioridade, a Igreja deve levar a sério a subjetividade para dialogar com o sujeito pós-moderno, ajudando-o a assumir sua identidade, porém sem perder o Evangelho. Para isso, é necessária uma teologia clara que contribua para o caminho de identidade de seguidor de Jesus Cristo. Uma teologia que diga algo para as pessoas. A Igreja precisa ser espaço de convivialidade e fé, onde cada um possa ser o que é, respeitando o tempo de cada um se descobrir e se fazer nesse caminho da interioridade, das suas próprias verdades mais profundas. A pastoral precisa ser ambiente que favoreça e potencialize o que o sujeito é, despertando o seu melhor no modo de ser, de viver, de se relacionar com Deus, consigo mesmo, com a natureza e com o outro.
Em toda ação evangelizadora o eixo central é o querigma, o anúncio central do mistério pascal, ou seja, da vida, paixão, morte e ressurreição de Jesus Cristo. Através do querigma, a pastoral ajuda as pessoas a fazerem a experiência do encontro com a pessoa de Jesus Cristo. Não se trata de um único e primeiro anúncio cronologicamente, mas sim de um anúncio que permeia e orienta toda a evangelização o tempo todo, uma mensagem que perpassa toda a pastoral, todo dia, pois a fé é sempre um apelo de Deus que nunca cessa de nos interpelar. 
Não há como ser discípulo e missionário de Jesus Cristo sem conhecê-lo. Durante muito tempo, a Igreja se apoiou no polo antropológico, baseado nas razões da fé, e o polo querigmático ficou esquecido, de forma que Jesus tornou-se desconhecido. Ninguém pode responder para o outro “Quem é Jesus”, pois a fé é individual, pessoal, entra pelos sentidos, depende da subjetividade. É necessário o equilíbrio entre esses dois polos, o antropológico e o querigmático.
Com a secularização, o mundo de Jesus Cristo tornou-se desconhecido. A fé cristã é vista num âmbito mais mágico, com uma espiritualidade sem religião e sem Deus, que acredita que a religião não seria mais necessária. É imperativo para a pastoral, um anúncio mais querigmático, que apresente o Deus de Jesus Cristo e a centralidade do mistério pascal na nossa vida.  É preciso reaprender a fazer pastoral, mudar nossos métodos. Passar de uma pastoral que mantém e consolida a fé para uma pastoral que suscite a novidade do Evangelho, que fale ao coração do novo sujeito emergido na pós-modernidade. A comunicação da fé exige uma pedagogia própria.
A pedagogia da iniciação é tarefa da pastoral. Pela iniciação, a pessoa é mergulhada na experiência do Cristo, na beleza do Evangelho e da fé e assim, mergulhada no Espírito, aprende a orar, rezar e celebrar melhor. Repensar o batismo de crianças e a catequese com adultos, com experiências mistagógica, são, portanto, tarefas do processo de iniciação.
O desafio comunitário ou eclesial é o desafio da pertença. Hoje não há mais fiéis fidelizados; de igreja em igreja, buscam um espaço que os ajude a firmar suas identidades. Buscam laços afetivos e não contratuais. A afinidade é que gera a pertença. Atividades lúdicas e artísticas são opções para a pastoral criar espaços de convivialidade e fraternidade. A arte contribui muito com a fé, que é eclesial e também pessoal, mas não individual. Pequenos momentos de espiritualidade e a prática de comer juntos também ajudam a estreitar os laços, suscitam o desejo de pertença. Um grande desafio pastoral hoje é formar comunidades fortes, com laços de pertença frágeis.
O desafio da solidariedade ou cidadania diz respeito ao compromisso ético da tarefa cristã. 
É tarefa da fé cristã denunciar as injustiças sociais, os abusos do capitalismo, repudiar de todo o coração o acúmulo de riqueza, impulsionar e esperançar os cristãos para criar uma sociedade mais justa, livre e fraterna, com um sistema econômico mais igualitário. 
Entre os desafios citados da pastoral urbana percebe-se uma estreita relação. A interioridade reflete na compreensão do querigma, que com uma pedagogia adequada situa o sujeito no desafio comunitário e da cidadania.  
Uma Igreja unicamente fornecedora de conhecimento intelectual de Deus não funciona mais. Precisa pensar globalmente e atuar localmente, pensar grande e tomar pequenas atitudes que derrubem a indiferença com o sofrimento do outro, uma vez que somos todos irmãos em Cristo.
A crise da pastoral urbana é grande. A agenda da pastoral urbana deve ser revista, incluindo o conjunto de processos tradicionais de transmissão da fé que não surtem mais efeito, escutando as perguntas existenciais de hoje que exigem respostas teológicas maduras. E, assim estabelecer sua práxis entre a Boa Nova e a situação concreta da vida. Os desafios das cidades são muitos e precisam ser vistos com otimismo e coragem. Os agentes de pastoral precisam de formação, de estarem dispostos e minimamente aptos a participar de discussões críticas. 
Aberta à ação do Espírito que conduz a Igreja, a pastoral será capaz de comunicar a boa nova da fé, mesmo em meio aos desafios urbanos, em tempos sombrios.