73. Dar testemunho ou ser testemunhas?


Nas comunidades eclesiais, vai e volta a gente houve alguém falar assim: “Tal pessoa não pode ser catequista porque não dá testemunho” ou “É triste um cristão que não dá testemunho”. Fora raríssimas exceções, na maioria das vezes, quem diz tal coisa está cobrando um testemunho no campo moral, especialmente na área da sexualidade. São expressões frequentes para falar de casais de segunda união, de mães solteiras, de homossexuais, de pessoas divorciadas ou de jovens que não pautam sua conduta sexual pelas orientações da Igreja.
De fato, o testemunho é exigência da vida cristã. A fé cristã não é como o baalismo dos cananeus que não exigia vida ética. Bastava ir lá nos lugares altos fazer um culto para Baal e tudo estava resolvido. O Deus da fecundidade fecundava a terra, os campos, os rebanhos, as mulheres... A vida ética é parte integrante do cristianismo; sem a práxis cristã não há fé cristã. A fé cristã é proclamada (teologia), celebrada (liturgia) e vivida (ética). Quando, porém, falamos da vida ética da fé cristã, não podemos nos esquecer de todas as dimensões da vida humana. Infringir uma norma da moral sexual não é mais nem menos grave que infringir normas da moral social, como explorar os funcionários, defraudar alguém, mentir, trapacear etc.
Nossos católicos andam muito preocupados com o tal do “dar testemunho”. Confundem-no com “ser testemunha”. Em Atos dos Apóstolos, Lucas escreve que os discípulos serão testemunhas do Ressuscitado (cf. At 1,8). Ser testemunhas do Ressuscitado é uma exigência lucana para ser continuador da obra de Jesus. O testemunho de que Lucas fala não é testemunho moral, do tipo “eu era um bêbado, vivia drogado, encontrei Jesus”. O testemunho exigido em Atos é a experiência de fé com o Ressuscitado.
Certamente, quem faz a experiência do encontro com o Ressuscitado terá sua vida transformada por ele. Como diz Paulo “passou o que era velho, eis que tudo se fez novo” (2Cor 5,17). Mas a vigilância exagerada sobre o testemunho moral pode dar efeito contrário. A vida moral e ética sempre ilibada do cristão não vem da pressão da comunidade eclesial, nem da culpa, mas do encontro com o Deus da vida, capaz de modificar nossa existência com sua presença transformadora.
Preocupa-me a realidade eclesial atual, quando percebo que alguns presbíteros – em vez de promover o encontro de suas ovelhas com Jesus, o Bom Pastor – ficam feito carrascos vigiando sua gente, torturando-a com a teologia do medo. Alguns chegam a ameaçar os fiéis na hora da comunhão com advertências do tipo “Quem não estiver verdadeiramente preparado para receber a eucaristia não deve comungar ou estará comungando sua própria condenação”. Ora, vai me dizer que alguém está preparado para tão grande mistério? Ninguém é merecedor da entrega de Jesus. A eucaristia é puro dom, gratuidade de Jesus que quis permanecer sempre entre nós. Nem mesmo o presbítero que preside a eucaristia é digno de recebê-la. Cada qual tem “seu telhado de vidro”. Além do mais, a hora da missa não é hora desse tipo de coisa. Há necessidade de formar a consciência moral do povo? Que seja feito, portanto, em encontros, palestras, cursos e na prática diária da comunidade, mas não ameaçando o povo na hora da comunhão. Fica aí a dica!
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