5. A felicidade


De novo o tema da felicidade, tão caro nos tempos atuais. Já repararam como não é incomum alguém nos dar uma notícia que a princípio soa meio estranha sobre um amigo ou parente e a gente logo diz: “Mas ele tá feliz?”. Se ele está feliz, parece valer tudo.
Muitos teólogos, sociólogos e outros estudiosos abominam esta característica da pós-modernidade. Chamam-na de hedonista, narcisista, individualista, presentista e todos os istas que pudermos imaginar. Mas será que a busca da felicidade é mesmo um perigo e algo contra o evangelho? Será que a boa-nova de Jesus não é fonte de alegria e paz? Ou a vida cristã deve ser triste e penitente, cada um com sua cruz, sofrendo os males e conformado-se com a sorte que Deus lhe deu?
Vamos dar um passeio pelas Escrituras Sagradas, a bíblia.
A felicidade é o projeto de Deus para todos nós. Desde o Livro do Gênesis percebemos isto (cf. Gn 1–2). Ao falar da criação do mundo, o autor sagrado afirma que Deus, primeiramente, criou todas as coisas, preparou um belo jardim, para só depois criar o homem e a mulher e colocá-los ali. Enquanto o povo politeísta – que cultuava muitos deuses – pensava que a vida humana era castigo dos deuses e entendia o mundo como um deserto no qual deveríamos peregrinar aceitando passivamente este destino implacável, o autor do Gênesis mostra que a fé monoteísta pensa diferente: Deus criou o ser humano e viu que era bom, colocou nele o seu sopro, colocou-o num jardim maravilhoso cheio de árvores frutíferas, rios e pedras preciosas. São imagens, símbolos, para dizer como a vida é bela e como a felicidade faz parte dos planos de Deus. Viver é uma dádiva, apesar de suas dores, e não um castigo, uma sina que não podemos evitar. O mundo é belo – como um jardim – e temos elementos para nos proporcionar esta felicidade: água, frutos, pedras preciosas – como preciosa é a vida.
E não faltam no Antigo Testamento textos que mostram a importância da felicidade e apontam para a Palavra de Deus como fonte de alegria e força. O livro do Eclesiástico chega a dizer que a gente não deve entregar a alma à tristeza. Ao contrário, deve buscar a alegria, pois ela é a vida da pessoa. E adverte os leitores para tomar muito cuidado, pois a tristeza e a raiva já mataram a muitos, enquanto que a alegria revigorou os ânimos (cf. Eclo 30,22-27).
E os Evangelhos? Eles não se cansam de mostrar que a presença de Jesus é boa notícia que traz a alegria: “Eis que eu vos anuncio uma boa notícia que será motivo de alegria para todo o povo” (Lc 2,10), escreve Lucas no anúncio do nascimento do menino Jesus aos pastores. E a motivação para a alegria continua. O apóstolo Paulo diz: “Alegrai-vos sempre no Senhor. Repito: alegrai-vos!” (Fl 4,4).
Como se não bastassem as motivações da Escritura, o papa Francisco escreveu a bela exortação “A alegria do evangelho”. Bem em tempo! Em época em que a felicidade tornou-se um bem precioso atrás do qual todos acorrem, Francisco lembra que o evangelho é fonte de alegria, e que a vida carrancuda não condiz com a proposta de Jesus Cristo.
Uma vez que entendemos que a Escritura mostra a vida humana criada para a felicidade e que o evangelho é fonte de alegria, não faz sentido viver atolado na tristeza, como se a felicidade não fosse para nós. Deus nos chama para a felicidade. Esta é nossa vocação e ela se concretiza em Cristo.
E o que a catequese tem a ver com isto? Muita coisa! Se a felicidade é vocação do ser humano, é tarefa da catequese transmitir essa alegria. Se nossa catequese realmente proporciona a experiência do encontro com Jesus ressuscitado, a alegria será inevitável. Não é possível fazer o encontro com Jesus e continuar o mesmo. Sua presença nos transforma, nos anima, nos restaura. Sua força nos sustenta na caminhada e uma vida nova começa para quem o acolhe. É só ler os relatos do evangelho. Cada pessoa que encontrava Jesus descobria dentro de si alegria e força para recomeçar. Uma energia nova era desprendida de dentro da pessoa e sua inércia era vencida por causa do amor que Jesus lhe dedicava. É essa energia transformadora que nossos encontros precisam gerar. Ao sair da catequese, nossos catequizandos – crianças, jovens ou adultos – devem sentir que uma energia nova os invade e que eles têm força para viver mais uma semana, enfrentando os desafios da vida, pois não estão sozinhos. O Deus da vida, aquele que fortalece os ânimos do abatido, está sempre junto de cada um de nós. Isso não significa certamente que a vida vai virar um mar de rosas, sem espinhos ou atropelos. Nada disso, mas, nas intempéries da vida, não estamos abandonados à própria sorte: Jesus está conosco e nos ampara, dando-nos força pra viver. A felicidade não vem da ausência de problemas, mas da certeza do amor que Deus nos dedica em Cristo Jesus.
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