6. O déficit da iniciação


A expressão déficit de iniciação, usada em artigos anteriores, causou curiosidade. Alguns leitores sugeriram que retomássemos o assunto. Pois bem, vamos lá! São muitas as perguntas: “O que significa déficit de iniciação? Quais suas raízes? Como lidar com ele? Como contribuir para que a iniciação saia do ‘vermelho’”? Etc. Façamos o seguinte: a cada artigo, respondamos a uma questão.
O que significa a expressão déficit de iniciação? Tomemos os termos. Primeiramente, iniciação. Ser iniciado na fé, que é o nosso caso, é começar a fazer parte de um mundo de significações e símbolos que passam a orientar toda a vida da gente: nossos valores, nossas decisões, nossas referências... tudo ganha novo rumo quando somos mergulhados no mistério do amor de Deus que é revelado em Jesus Cristo por força de seu Espírito. O iniciado é aquele que foi mergulhado neste mistério; por isso, o sacramento da iniciação por excelência é o batismo. Por ele, fomos mergulhados em Cristo para uma vida nova; a vida velha ficou sepultada no passado, pois já não significa nada mais para nós cristãos. Então, iniciação é o processo pelo qual a entrada na fé acontece; é o processo pelo qual o mergulho em Deus é realizado. A partir desse processo, uma vida nova começa para o iniciado.
E o que significa déficit? Déficit,diz o dicionário do Aurélio, é “o que falta para completar uma quantidade”. A definição parece boa para falar da iniciação. Se a iniciação é o mergulho em Deus, logo, déficit de iniciação é uma lacuna, uma falta nesse processo. Falta muito pra nossa gente ser mergulhada no mistério maravilhoso do amor de Deus. Os católicos sabem algumas coisas sobre Deus, decoraram algumas orações, conservaram alguns costumes religiosos, mas não experimentaram o mergulho, não ficaram impregnadas da presença do Espírito, essa água viva que renova. Sobre a iniciação, já ouviram falar; sabem os ritos que a acompanham, as orações que são feitas... Mas não basta isso.
Ao longo dos anos, a Igreja – sobre isso falaremos no próximo artigo – dedicou-se muito aos sacramentos, mas não o mesmo tanto ao processo evangelizador. Acontece, porém, que a iniciação – ou seja, o processo de adesão a Jesus Cristo – não acontece num passe de mágica. Não se dá só pelos sacramentos. Não basta batizar, crismar e dar a comunhão – os sacramentos da iniciação cristã – para a pessoa ser iniciada na fé. Os sacramentos devem ser o sinal visível do que acontece no interior da pessoa. Eles efetivam o mistério celebrado; exteriorizam o que interiormente já vinha acontecendo na vida daquele que os recebe. Às vezes, a pessoa pode ser sacramentalmente iniciada e não ser iniciada na fé. Aí vem o déficit de iniciação. As duas coisas – sacramentos da iniciação e iniciação na fé – deveriam andar juntas, mas nem sempre funciona assim. Então a iniciação sacramental é alta, mas a iniciação na fé é baixa. Logo, temos um déficit de iniciação. Falta fé cristã genuína, autêntica... falta experiência de Deus... falta encontro com o Senhor... falta discipulado... falta seguimento. Se falta tudo isso, a iniciação sacramental somente não dá conta de sustentar as pessoas diante dos desafios da vida. Ela é importante, é claro, mas não suficiente. Os problemas da vida são muitos e grandes. Se a fé não cresce, não amadurece, não se firma a cada dia, se ela não acompanha os desafios que encontramos na vida, logo temos um déficit de iniciação. Falta iniciação na fé para completar a quantidade de fé exigida pelos desafios da vida. Falta experiência cristã de Deus, apesar de as pessoas serem batizadas. Falta iniciação na fé em relação ao processo sacramental desenvolvido: a isso chamamos de déficit de iniciação.
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