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7. Os magos que viraram reis

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08.05.2014 | 5 minutos de leitura
Aíla Luzia Pinheiro de Andrade
Curiosidades
7. Os magos que viraram reis

No Evangelho de Mateus (cf. 2,1-12), temos o curioso relato da procura dos magos pelo menino Jesus, guiados pela estrela. A Bíblia não fala, porém, de “três reis magos” como conservou a tradição e a religiosidade popular. Quem eram esses magos? De onde vem o número três e o nome destes homens?


Primeiramente devemos nos lembrar de que o relato de Mateus não é um relato factual, ou seja, não se refere a um fato acontecido, mas a um fato teológico. Trata-se de um midraxe: um relato com intenção de atualizar a Escritura para mostrar sua força. Não e incomum nos Evangelhos este tipo de narrativa, assim como no Antigo Testamento (cf. ./4-jonas-a-misericordia-de-deus-abraca-a-todos/).


Primeiramente, a bíblia não fala de reis. Os reis magos não são reis, mas uma mistura de astrônomos com astrólogos; homens que observavam os astros para ver os sinais dos céus. Eram sábios, estudiosos dos astros que, por meio dos sinais celestes, faziam a leitura da vida. A expressão reis para eles não é bem acertada. Aquela imagem de reis com vestes especiais, coroa e tudo mais foi criação da imaginação dos artistas que, equivocados quanto à função dos personagens bíblicos, vestiram-no com glamour e luxo.


Em segundo lugar, a bíblia fala dos presentes que os tais magos levaram para o menino Jesus: ouro, incenso e mirra. Os presentes ofertados pelos magos (ou seja, astrólogos), vindos de Anatólia (Oriente), são simbólicos. O ouro simboliza a realeza; o incenso simboliza a divindade e a mirra simboliza a humanidade. Mateus está dizendo para sua comunidade que Jesus de Nazaré, a quem seus membros seguem e adoram, é de fato digno de toda credibilidade. Ele é o messias esperado da casa de Davi. A partir destes três símbolos, a religiosidade concluiu que são três pessoas, por serem três presentes. De novo insistimos, Mateus não fala nada disto. Seu relato é teológico; não factual. Esta crença foi confirmada pelo Proto-Evangelho de Tiago (21,1-4), que é do ano 150 dC e que menciona os três reis.


Há um texto siríaco do século VI, chamado A Caverna dos Tesouros, que os nomeia assim:


1) Hormizdah, rei da Pérsia.


2) Yazdegerd, rei de Sabá.


3) Perozadh, rei de Seba.


Depois veio o tratado Excerpta et Collectanea de autoria do monge Beda, o Venerável (673-735). Os “três reis” magos são assim descritos, por Beda, segundo as etnias:


1) O branco: MELCHIOR: com aproximadamente 40 anos, simbolizava a Europa; seu presente, o ouro.


2) O indiano: GASPAR, com 15 anos, representava a Ásia; seu presente, o incenso.


3) O negro: BALTAZAR, com cerca de 30 anos, simbolizava a África; o seu presente, a mirra.


Mas, se o texto bíblico não diz que eram três, nem que eram reis, então, de onde surgiram seus nomes? De uma confusão na tradução da seguinte frase que aparece num mosaico de uma antiga igreja cristã:


"Ele é o rei da luz, o branco, senhor dos tesouros".


"rei da luz" = MELCHIOR


"o branco" = gathaspa = GASPAR


"senhor dos tesouros" = bithisarea = BALTAZAR


As relíquias desses três reis que nunca existiram estão na Catedral de Colônia, na República Federal da Alemanha. Tem até peregrinação para ver as relíquias dos “três reis”.
Certamente o Proto-evangelho de Tiago e o Evangelho de Mateus estejam apenas fazendo um midraxe de algumas passagens messiânicas:


Sl 72,10-11: “Os reis de Társis e das ilhas vão trazer-lhe ofertas. Os reis de Sabá e Seba vão pagar-lhe tributo; todos os reis se prostrarão diante dele, as nações todas o servirão”.


Is 60,6: “Uma horda de camelos te inundará, os camelinhos de Madiã e Efa; todos virão de Sabá trazendo ouro e incenso e proclamando os louvores de YHWH”.


Sobre os presentes dos magos, devemos dizer que, na Antiguidade, ouro era o presente para um rei; incenso, para um sacerdote; e mirra, para um profeta. A mirra também era usada para embalsamar corpos e, simbolicamente, representava a mortalidade.
Os dons oferecidos (ouro, incenso e mirra) certamente queiram apenas simbolizar a realeza, a divindade e a mortalidade (humanidade) de Jesus. Trata-se, pois, de um midraxe.


Então, o que dizer dos presépios que trazem a imagem de 3 reis com coroa e tudo, camelos e presentes, uma estrela brilhando no alto do céu, ovelhas e pastores ao redor, além de um galo no alto da gruta?


Bom, a religiosidade popular fez uma salada. Ajuntou dados de muitos lugares distintos. Os reis e a gruta vieram do Proto-evangelho de Tiago; os camelos e os presentes vieram do Sl 72 e de Is 60; a estrela veio do Evangelho de Mateus; os pastores e as ovelhas vieram do Evangelho de Lucas. E o galo? O galo e o anjo Gabriel vieram da Cabala. É o seguinte: o nascimento de Jesus significa o julgamento de Deus. Julgamento em heb é gevurah (raiz GVR). O anjo do julgamento é Gabriel (GVR + 'L) é o anjo feito de fogo. Quando ele passa, lança fagulhas e o galo (gever - GVR) percebe e canta. Quanta imaginação tem o povo, não?