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114. Colo de pai

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29.11.2016 | 4 minutos de leitura
Jéssica Oliveira
Crônicas
114. Colo de pai

“… gerado não do sangue, nem da vontade da carne,

nem da vontade do homem, mas de Deus” (Jo 1,13).



“O dom de ser filho;

nascer da gratuidade de alguém

que decide ser Pai”


(autor desconhecido)


Quem não gosta de um colo de Pai?


Lembro-me de minha infância: as brincadeiras, as “lambanças”, as traquinagens de criança… A memória aflora e vem a saudade. Como é bom recordar! Porém nem tudo ficou para trás. Tem uma lembrança que é tão atual, que rompe os limites do tempo, pois seja ontem, seja hoje, seja amanhã, continuo sendo a mesma: filha!


O dia tinha sua rotina que nem sempre me dava tanta alegria: acordar cedo, ir para a escola, voltar e almoçar, fazer o “para casa” e ajudar minha mãe nas tarefas domésticas. Eu brincava e aprontava, mas o momento mais esperado era o pôr do sol!


Arrumava-me bem bonita e sentava-me na porta de minha casa na espreita dele que estava para chegar. Com os olhos fitos na esquina, aguardava ansiosa por meu pai que voltava do trabalho.


Ao vê-lo despontar, dava um salto e saía correndo ao seu encontro.Corria até ele e, ao me aproximar, ele abria os seus braços e eu, sem pensar, lançava-me em seu colo. E, em seu colo, fazia o caminho de volta para casa.


O resto do dia era com ele! Conversávamos,me perguntava o que tinha feito, jantávamos juntos e, para concluir o dia, me fazia dormir contando-me suas histórias. Eu adorava esse ritual e adormecia feliz em seu colo.


Hoje tenho quase trinta anos e, quando encontro meu pai, aquele colo é sempre o mesmo. É um tempo sem tempo; um momento sem limite, porque naquele instante só importa isso: eu sou sua filha e ele é meu pai!


Ser filho: herança, conquista ou dom? Poderia dizer que isso é óbvio, pois afinal ele me gerou e é meu pai. Mas esse argumento cai diante de tantas crianças abandonadas por seus pais; ou, até mesmo, violentadas por eles. E o que dizer de crianças adotadas que também vivem uma bela experiência filial? Poderia dizer que sou uma boa filha e, por isso, meu pai é bom comigo. Mas também esta resposta não se sustenta, pois como meu pai saberia eu que seria uma boa filha? Ou que garantia ele tem de que continuarei a sê-lo? A verdade é que, antes mesmo de ser uma boa filha, meu pai me quis! Ser filho é um dom, dom que nasce “da gratuidade de um pai”.


O evangelista João, no prólogo do Quarto Evangelho, fala-nos sobre a filiação. Diante dos judeus, que se consideravam filhos pela descendência, e diante dos gnósticos, que achavam que poderiam alcançar a iluminação pelo conhecimento, João nos fala que ninguém se promove a filho, mas somos adotados no Filho, Jesus: “Ele nos predestinou a sermos seus filhos adotivos em Jesus Cristo” (Ef 1,5). Desta forma, assim como Jesus não foi “gerado do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus” (Jo 1,13), também nós cristãos nos tornamos filhos no Filho, pela vontade de Deus, ou seja, por seu amor generoso e gratuito.


Se compreendêssemos isso, talvez viveríamos como irmãos! Se compreendêssemos isso, deixaríamos a Palavra de Deus, que dá a capacidade para o novo nascimento, agir em nós. É Jesus quem torna possível esse novo nascimento e não uma tradição de família ou uma “fidelidade” aos preceitos cristãos.


Ser filho: herança, conquista ou dom? Ser filho é um dom, dom que nasce da gratuidade de um Pai: Deus!